"Seja bom, pelo
amor de Satã... seja bom!"
Todos os dias Yves
acordava cedo. Os olhos cansados contemplavam o rosto acabado.
Murmurava para o
espelho sua oração:
- Patético.
E andava rápido em
seu patético carro, enfiava-se no engarrafamento patético para chegar ao
emprego igualmente patético.
O dia passa entre as
malditas ligações. Subemprego, soa como deve soar. A comida da lanchonete o fez
engordar, a rotina o tornou ansioso.
Duas décadas e meia
de uma vida insignificante. Sentado, com o fone ao ouvido sentindo a existência
escoar lentamente.
Acostumou a atender
os mal-educados que costumavam ofender sua adorável mãe todos os dias. Era
gentil e bom com os novos funcionários que iam aprender o ofício com ele.
Estava acostumado a
ouvir:
- Como você aguentou
ficar três anos neste inferno?
Respondia automático:
- Não é tão ruim
quando se acostuma.
Quando se acostuma a
destruir o orgulho, seus ouvidos, sua voz. Quando se acostuma a ver os
puxa-sacos ganharem puxa-sacos ao subirem de cargo.
Acostuma-se a ganhar
dinheiro para instituições que claramente o viam como algarismo.
Um número de
funcionário.
Ia começar a seleção
interna para escolha do funcionário do mês, se ganhasse lhe dariam um broche
idiota. Seu nome enfeitaria uma folha de sulfite imbecil.
Poderia usufruir de
uma folga bônus.
Uma.
Neste mês, ele
cumprira os requisitos básicos da eleição. Para ser elegível o candidato não
podia ter faltas injustificadas e advertências.
No mês anterior Yves
teve de assistir Willian se tornar o funcionário do mês.
Willian, que tinha a
supervisora em boa conta, que escondia suas faltas com resultados em vendas,
que era um supremo lambe-botas. Um safado protegido.
Yves faltou uma única
vez no mês anterior por uma emergência familiar. Explicou tudo a supervisão e
ganhou uma advertência.